terça-feira, 20 de abril de 2010

Cheiros e Gostos

Quando a gente, do quintal, sentia cheiro de bolo assando, era prenúncio que iríamos passear. Mamãe quando ia à casa das cunhadas, sempre levava um bolo para o café da tarde.

As quitandas da minha infância perfumam as minhas memórias. Empadas, daquelas que se desfazem dentro da boca, eram motivos de travessuras da criançada para raspar o resto da massa que não tinha ido para a forma, cada um com uma colher esperando mamãe liberar a vasilha.
Dona Siriaca vendia bolinho de feijão, quando a avistávamos chegando ao princípio da rua, corríamos gritando para que mamãe comprasse para nós, era uma festa!

Nos aniversários, nas novenas, nas festas juninas e em qualquer comemoração os quitutes estavam presentes: o pão de queijo, o biscoito de polvilho, a broa de milho, a queijadinha, o quindim, o brigadeiro, a goiabada cascão e todos os doces em compota, como doce de laranja da terra, doce de batata doce, doce de leite, arroz doce, doce de fígo.

Quando ando hoje pelo Mercado Central os cheiros das frutas me transportam para os quintais em volta da minha casa.
Na casa da Dona Melinha tinha um pé de Marmelo que tanto nos dava o sabor da fruta, quanto a dor da surra com a sua vara.
O abacateiro que eu sempre cantei nos meus versos, dava sombra ao chão que pisávamos e também um delicioso fruto que comíamos de várias formas.
Na casa da Dona Gabriela tinha um pé de manga, na casa da dona Ifigênia tinha uma parreira de uva, que cacheava perto do natal.
Na minha infância não tinha muros, todas as casas eram no máximo cercadas com arame farpado.
Então corríamos livres por toda a vizinhança e nos fartávamos de todos os frutos da região: Laranja, Goiaba, Banana, Ameixa, Mexerica, Mamão.
Tinha também um canavial em cada lote, três ou quatro pés de cana, que como eram grandes, para nós pequenos, era um canavial. Alem de chupar cana também éramos agraciados com a garapa.
Tinha uma fruta rara, que a gente ganhava só quando estávamos acometidos daquelas doenças comum da infância: Catapora, Sarampo, Coqueluche, Varicela: A Maçã, fruta que era importada da Argentina e vinha envolta num papel de seda roxo. Sempre que adoecíamos alguém vinha visitar e trazia a Maçã. Por isso este cheiro de remédio, me invade a memória quando como Maçã.
A Amora e a Pitanga dividíamos com os pássaros, que povoavam os nossos quintais: Sabiá, Bico de lacre, rolinhas, pardais, beija-flor, Azulão, Canário Belga, Canário Chapinha, Tiziu, Bem-Te-Vi.

Na nossa casa havia um alpendre, uma espécie de varanda, que dava entrada para sala principal da casa, as paredes eram pintadas até a metade e a parte superior era pintada com um afresco qualquer. O chão era de cimento vermelho, lembro-me das minhas irmãs encerando com o escovão fazendo o chão ficar como espelho. As samambaias choronas penduradas no teto vinham até o chão. Neste espaço eu brincava com os carrinhos feitos de caixa de fósforo, ou burrinhos e vaquinhas feitas de bucha que dava na cerca.
Às vezes esta brincadeira era interrompida pelo barulho que vinha da rua.
O congado.
De longe ouvíamos o som dos tambores, as caixas, pandeiros, gungas nos pés e parangones nas mãos e corríamos para ver o congado passar com as pessoas cantando e bailando, manifestando a sua fé, prestando homenagem a Nossa senhora do Rosário, São Benedito e os santos da devoção de cada um.
No mês de agosto era festejado o mês de Nossa Senhora do Rosário. Havia o encontro de congados e festa durante todo o dia, uma festa bonita e cheia de comidas.

No mês de junho havia as quadrilhas.
Nos meses de abril e maio a gente já começava a ensaiar. Tinha as quadrilhas das crianças e dos jovens.
Era o mês da canjica, do pé de moleque, do amendoim torrado, dos fogos! AH! Os fogos! Brincávamos com bombinhas, só os adultos podiam soltar foguetes. Junho era o mês de festas.
Como era bonito ver as minhas irmãs vestidas para a quadrilha.
Os vestidos rodados eram lindos. Toda menina vestida para dançar quadrilha ficava bonita.

2 comentários:

Edna Lima disse...

Quanto saudosismo! Hoje tudo se compra pronto e os vestidos de quadrilha não são mais os mesmos. Bjs Edna

Osmar Mendes Junior disse...

Parabéns pelo belo e sensível texto! Lembrei-me da minha própria infância, que teve momentos parecidos! Lembrei-me também do livro "No Caminho de Swann". Marcel Proust voltou à infância quando, já adulto, mordeu um biscoito de receita muito antiga.
Faço votos que a publicação do livro se concretize!