A vida é cheia de emaranhados que
só o coração pode entender. Gonzaguinha conseguiu nos mostrar isso quando
cantou: “Eu fico com a pureza das crianças, é a vida é a vida”.
Tia Dinha já estava com
Alzheimer, passava mais tempo na cama que em pê. Dificuldade de alimentação e
outras coisas comum da doença. Nós estávamos sempre por perto. Esforçávamos
para ela levantar e ir tomar café à mesa junto conosco. Para estimular dizíamos
para as crianças ir ao quarto chamá-la.
Um dia surpreendi o meu neto
(Miguel, dois anos) à beira da cama com o seu pão, oferecendo um pedaço para
ela. Ela aceitava e comia.
Um ato puro de comunhão.
Quando a minha sogra faleceu,
minha filha tinha 8 anos ou um pouco menos, a levamos ao velório e sepultamento.
Ela ficou curiosa com a quantidade coroa de flores e quis saber o porquê que as
pessoas mandavam as coroas. Eu disse ser para homenagear a sua avó. Para
abrandar o momento, perguntei-lhe se ela queria também fazer a homenagem. Ela
aceitou a ideia e fomos à flora perto do cemitério, ela escolheu as flores e
fizemos um buquê. Carregou consigo as flores durante todo o tempo e na hora do
sepultamento, quando a urna baixou ao túmulo ela simplesmente jogou o buquê
dentro e me disse: "fiz a minha homenagem."
Tia Santa faleceu. A relação de
carinho com os meus netos era a mesma que ela tinha com todas as crianças e
adultos com quem ela convivia. Minha filha, chorando, foi contar para as
crianças, Júlia de 10 anos e Miguel de 6. A Júlia começou a chorar... Miguel a
pesar de demostrar tristeza, não chorou, e falou mansinho para a mãe: ela está
chorando porque ela conhecia a Tia Santa a mais tempo que eu.
E assim, com a sabedoria das
crianças, vamos abrandando o nosso coração.
“Nessa estrada não nos cabe
Conhecer ou ver o que virá
O fim dela, ninguém sabe
Nem ao certo onde vai dar
Vamos todos numa linda passarela
de uma aquarela
Que um dia enfim (descolorirá) ”
(Aquarela de Toquinho)
Em tempo: Desde que a minha filha
nasceu, todos os irmãos e cunhados eu chamo de tio.
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