quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Amanhã é meu aniversário

Resposta ao Tempo

Composição: Aldir Blanc/Cristovão Bastos

Batidas na porta da frente
É o tempo
Eu bebo um pouquinho
Prá ter argumento...
Mas fico sem jeito
Calado, ele ri
Ele zomba do quanto eu chorei
Porque sabe passar
E eu não sei
Num dia azul de verão
Sinto o vento
Há fôlhas no meu coração
É o tempo...Recordo um amor que perdi
Ele ri
Diz que somos iguais
Se eu notei
Pois não sabe ficar
E eu também não sei...
E gira em volta de mim
Sussurra que apaga os caminhos
Que amores terminam no escuro
Sozinhos...Respondo que ele aprisiona
Eu liberto
Que ele adormece as paixões
Eu desperto...
E o tempo se rói
Com inveja de mim
Me vigia querendo aprender
Como eu morro de amor
Prá tentar reviver...No fundo é uma eterna criança
Que não soube amadurecer
Eu posso, ele não vai poderMe esquecer...

domingo, 18 de novembro de 2007

Aos Grandes Amores

Ne me quite pas
Il faut oublier
Tout peut s'oublier
Qui s'enfuit déjà
Oublier le temps
Des malentendus
Et le temps perdu
À savoir comment
Oublier ces heures
Qui tuaient parfois
À coups de pourquoi
Le coeur du bonheure
Ne me quite pas
Moi je t'offrirai
Des perles de pluieVenues de pays
Où il ne pleut pas
Je creuserai la terre
Jusqu'après ma mort
Pour couvrir ton corps
D'or et de lumière
Je ferai un domaine
Où l'amour sera roi
Où l'amour sera loi
Où tu seras reine
Ne me quite pas
Ne me quite pas
Je t'inventerai
Des mots insensés
Que tu comprendras
Je te parlerai
De ces amants là
Qui ont vu deux fois
Leurs coeurs s'embrasser
Je te raconterai
L'histoire de ce roi
Mort de n'avoir pas
Pu te rencontrer
Ne me quite pas
On a vu souvent
Rejaillir le feu
De l'ancien volcan
Qu'on croyait trop vieux
Il est paraît-il
Des terres brûlées
Donnant plus de blé
Qu'un meilleur avril
Et quand vient le soir
Pour qu'un ciel flamboie
Le rouge et le noir
Ne s'épousent-ils pas
Ne me quite pas
Ne me quite pas
Je ne veux plus pleurer
Je ne veux plus parler
Je me cacherai là
À te regarder
Danser et sourire
Et à t'écouter
Chanter et puis rire
Laisse-moi devenir
L'ombre de ton ombre
L'ombre de ta main
L'ombre de ton chien
Ne me quite pas
Saudades
Saudades
Saudades...
Oh ! je voudrais tant que tu te souviennesDes jours heureux où nous étions amis.En ce temps-là la vie était plus belle,Et le soleil plus brûlant qu'aujourd'hui.Les feuilles mortes se ramassent à la pelle.Tu vois, je n'ai pas oublié...Les feuilles mortes se ramassent à la pelle,Les souvenirs et les regrets aussiEt le vent du nord les emporteDans la nuit froide de l'oubli.Tu vois, je n'ai pas oubliéLa chanson que tu me chantais.
C'est une chanson qui nous ressemble.Toi, tu m'aimais et je t'aimaisEt nous vivions tous deux ensemble,Toi qui m'aimais, moi qui t'aimais.Mais la vie sépare ceux qui s'aiment,Tout doucement, sans faire de bruitEt la mer efface sur le sableLes pas des amants désunis.
Les feuilles mortes se ramassent à la pelle,Les souvenirs et les regrets aussiMais mon amour silencieux et fidèleSourit toujours et remercie la vie.Je t'aimais tant, tu étais si jolie.Comment veux-tu que je t'oublie ?En ce temps-là, la vie était plus belleEt le soleil plus brûlant qu'aujourd'hui.Tu étais ma plus douce amieMais je n'ai que faire des regretsEt la chanson que tu chantais,Toujours, toujours je l'entendrai !
Este Texto que trabalhamos em uma aula de Teologia, foi um dos causadores, da minha ida à Colombia. Gabriel Garcia Marques sempre me impresionou com o seu realismo fantástico.


O afogado mais bonito do mundo

Rubem Alves

Só leio livros escritos com sangue. Depois que os devoro, deixam de pertencer ao autor. São meus porque circulam na minha carne e no meu sangue.
É o caso do conto "O Afogado Mais Bonito do Mundo", de Gabriel García Márquez. Ele escreveu. Eu li e devorei. Agora é meu. Eu o reconto.
É sobre uma vila de pescadores perdida em nenhum lugar, o enfado misturado com o ar, cada novo dia já nascendo velho, as mesmas palavras ocas, os mesmos gestos vazios, os mesmos corpos opacos, a excitação do amor sendo algo de que ninguém mais se lembrava... Aconteceu que, num dia como todos os outros, um menino viu uma forma estranha flutuando longe no mar. E ele gritou. Todos correram. Num lugar como aquele até uma forma estranha é motivo de festa. E ali ficaram na praia, olhando, esperando. Até que o mar, sem pressa, trouxe a coisa e a colocou na areia, para o desapontamento de todos: era um homem morto. Todos os homens mortos são parecidos porque há apenas uma coisa a se fazer com eles: enterrar. E, naquela vila, o costume era que as mulheres preparassem os mortos para o sepultamento. Assim, carregaram o cadáver para uma casa, as mulheres dentro, os homens fora. E o silêncio era grande enquanto o limpavam das algas e liquens, mortalhas verdes do mar. Mas, repentinamente, uma voz quebrou o silêncio. Uma mulher balbuciou: "Se ele tivesse vivido entre nós, ele teria de ter curvado a cabeça sempre ao entrar em nossas casas. Ele é muito alto...".
Todas as mulheres, sérias e silenciosas, fizeram sim com a cabeça. De novo o silêncio foi profundo, até que uma outra voz foi ouvida. Outra mulher... "Fico pensando em como teria sido a sua voz... Como o sussurro da brisa? Como o trovão das ondas? Será que ele conhecia aquela palavra secreta que, quando pronunciada, faz com que uma mulher apanhe uma flor e a coloque no cabelo?" E elas sorriram e olharam umas para as outras.
De novo o silêncio. E, de novo, a voz de outra mulher... "Essas mãos... Como são grandes! Que será que fizeram? Brincaram com crianças? Navegaram mares? Travaram batalhas? Construíram casas? Essas mãos: será que elas sabiam deslizar sobre o rosto de uma mulher, será que elas sabiam abraçar e acariciar o seu corpo?"
Aí todas elas riram que riram, suas faces vermelhas, e se surpreenderam ao perceber que o enterro estava se transformando numa ressurreição: um movimento nas suas carnes, sonhos esquecidos, que pensavam mortos, retornavam, cinzas virando fogo, desejos proibidos aparecendo na superfície de sua pele, os corpos vivos de novo e os rostos opacos brilhando com a luz da alegria.
Os maridos, de fora, observavam o que estava acontecendo e ficaram com ciúmes do afogado, ao perceberem que um morto tinha um poder que eles mesmos não tinham mais. E pensaram nos sonhos que nunca haviam tido, nos poemas que nunca haviam escrito, nos mares que nunca tinham navegado, nas mulheres que nunca haviam desejado.A história termina dizendo que finalmente enterraram o morto. Mas a aldeia nunca mais foi a mesma.

Folha de São Paulo. 27/06/07

Este também foi um dos livros que devorei neste ano.

Adeus, China - O último bailarino de Mao, Li Cunxin



O Último bailarino de Mao ensina, emociona, impressiona e que mostra a força que os sonhos exercem no destino de cada pessoa.


Leitura Obrigatória

O CAÇADOR DE PIPAS



Eu me tornei o que sou hoje aos doze anos, em um dia nublado e gélido do inverno de 1975. Lembro do momento exato em que isso aconteceu, quando estava agachado por detrás de uma parede de barro parcialmente desmoronada, espiando o beco que ficava perto do riacho congelado. Foi há muito tempo, mas descobri que não é verdade o que dizem a respeito do passado, essa história de que podemos enterrá-lo. Porque, de um jeito ou de outro, ele sempre consegue escapar. Olhando para trás, agora, percebo que passei os últimos vinte e seis anos da minha vida espiando aquele beco deserto. Um dia, no verão passado, meu amigo Rahim Khan me ligou do Paquistão. Pediu que eu fosse vê-lo. Parado ali na cozinha, com o fone no ouvido, sabia muito bem que não era só Rahim Khan que estava do outro lado daquela linha. Era o meu passado de pecados não expiados. Depois que desliguei, fui passear pelo lago Spreckels, na orla norte do parque da Golden Gate. O sol do início da tarde cintilava na água onde navegavam dezenas de barquinhos em miniatura, impulsionados por um ventinho ligeiro. Olhei então para cima e vi um par de pipas vermelhas planando no ar, com rabiolas compridas e azuis. Dançavam lá no alto, bem acima das árvores da ponta oeste do parque, por sobre os moinhos, voando lado a lado como um par de olhos fitando San Francisco, a cidade que eu agora chamava de lar. E, de repente, a voz de Hassan sussurrou nos meus ouvidos: "Por você, faria isso mil vezes!" Hassan, o menino de lábio leporino que corria atrás das pipas como ninguém.
Sentei em um banco do parque, perto de um salgueiro. Pensei em uma coisa que Rahim Khan disse um pouco antes de desligar, quase como algo que lhe houvesse ocorrido no último minuto. "Há um jeito de ser bom de novo." Ergui os olhos para as pipas gêmeas. Pensei em Hassan. Pensei em baba. Em Ali. Em Cabul. Pensei na vida que eu levava até que aquele inverno de 1975 chegou para mudar tudo. E fez de mim o que sou hoje.
SETE
No dia seguinte, enquanto preparava meu chá preto para o café da manhã, Hassan me contou que tinha tido um sonho.
— Estávamos no lago Ghargha — disse ele. — Você, eu, o pai, agha sahib, Rahim Khan e mais um monte de gente. Fazia sol, a temperatura estava ótima e o lago estava límpido como um espelho. Mas ninguém estava nadando porque andavam dizendo que um monstro tinha vindo para o lago. Estava escondido lá no fundo, só esperando...
Encheu a minha xícara, acrescentou o açúcar e soprou algumas vezes. Pôs então o chá diante de mim.
— Era por isso que todos estavam com medo de entrar na água. De repente, você descalçou os sapatos, Amir agha, e tirou a camisa. "Não tem monstro nenhum aí", disse. "Vou mostrar a todos vocês." E, antes que alguém pudesse impedi-lo, mergulhou na água e começou a nadar. Mergulhei também e saímos os dois nadando.
— Mas você não sabe nadar!
— É um sonho, Amir agha — disse Hassan rindo. — A gente pode fazer qualquer coisa. Seja como for, todo mundo começou a gritar: "Saiam daí! Saiam daí!", mas nós continuamos a nadar na água fria. Chegamos sãos e salvos ao meio do lago e paramos. Viramos na direção da margem e acenamos para as pessoas que estavam paradas lá. Pareciam formiguinhas, mas podíamos ouvir os seus aplausos. Agora estavam vendo. Não tinha monstro nenhum ali, só água. Depois disso, mudaram o nome do lago, que passou a se chamar "Lago de Amir e Hassan, sultões de Cabul", e podíamos cobrar das pessoas que quisessem ir nadar lá.
— E o que isso significa? — perguntei eu.
Ele passou geléia no meu naan e botou em um prato.
— Sei lá... Tinha esperanças que você me explicasse.
— Ora, é um sonho besta. Não acontece nada...
— O pai diz que os sonhos sempre querem dizer alguma coisa.
Tomei uns goles do meu chá.
— Então, por que não vai perguntar a ele, já que é tão esperto — disse eu, mais rispidamente do que pretendia. Não tinha dormido nada aquela noite. Meu pescoço e minhas costas estavam parecendo molas bem enroladas, e meus olhos pinicavam. De todo modo, tinha sido uma peste com Hassan. Quase pedi desculpas, mas acabei não fazendo nada. Hassan ia compreender que eu estava nervoso. Ele sempre compreendia o que acontecia comigo. Podia ouvir lá em cima o ruído da água escorrendo no banheiro de baba.-->

sábado, 17 de novembro de 2007

Para o Tio Neu


O BEIJO DERRADEIRO
Frei Fabiano Aguilar Satler, ofm

Cada morte é uma inexperiência única, Depois de passar uma, duas, três vezes pela experiência de ver partir pessoas que amamos, acreditamos que, na próxima vez, estaremos melhor preparados. Triste ilusão. A irmã morte mostra sua face no rosto de mais uma pessoa que amamos e nos descobrimos tão inexperientes e despreparados neste assunto como da primeira vez, talvez até pior. É que, se as pessoas são únicas, também é único o amor que devotamos a cada uma delas e também é única a dor que advém nesses momentos. Mas, lá estão a mesma sensação de palavras de ternura não ditas atravessadas na garganta e a vertigem do vazio momentâneo que se cria no nosso interior.

Como aceitar que as palavras do poeta fiquem mudas, que o abraço caloroso do filho nos pais se torne gélido e que os santos não mais nos recordem que somos continuamente visitados pela bondade de Deus? A visita inesperada da morte somente aguça essa sensação de perplexidade. É que a irmã morte costuma ser uma senhora temperamental. Com alguns, ela trava um demorado diálogo. Para outros, entretanto, ela apenas oferece o seu apressado beijo na face e o seu curto imperativo: vem.

Eu já deveria estar um pouco mais amigado com a morte, com a minha própria e com a dos outros. Aqui em Moçambique, a morte parece ser o pão-nosso de cada dia, é o arroz com feijão dos brasileiros: duas vezes por dia, sete vezes por semana. Na medida em que vamos nos adentrando no dia a dia deste povo, damo-nos conta desta triste realidade. Recordo-me dos meus primeiros dias de recém-chegado à Beira. Da varanda da nossa casa, vi passar um cortejo de carros apinhados de pessoas amontoadas umas sobre as outras, todas a cantar, na língua local, um canto com melodia em forma de lamento. Era um funeral. Foi o primeiro de tantos outros que continuam a se suceder.

É triste notar a facilidade com que se morre aqui. Fora daqui morre-se de cancro, de enfarto, de acidente, de velhice. Aqui, morre-se por morrer. Jovens, pais, filhos, crianças, a morte colhe a todos indistintamente. No decurso natural da vida, os filhos enterram seus pais. Aqui, com freqüência os pais enterram seus filhos. E existe tragédia maior na sociedade africana do que um pai enterrar um filho, onde o culto prestado pelos vivos aos seus antepassados assume um caráter central no meio dessa sociedade? A morte de um filho encerra a possibilidade de que o pai, após a sua morte, seja recordado pelos seus descendentes.

Neste ponto, proponho uma estratégia para acolher com serenidade o beijo da irmã morte na nossa própria face, quando essa hora chegar – ou seja, deste momento em diante: antes que a irmã morte nos beije em nosso rosto, beijemos nós a face da vida.

Beijar a vida significa amar todos aqueles que nos são confiados com toda a força do nosso entendimento e do nosso coração. Significa perceber o prenúncio da eternidade no pôr-do-sol da baía à nossa frente, sentir prazer em comer nos dias de festa e jejuar para serenar o irmão corpo no tempo oportuno. Beijar a vida significa a renúncia a perder o humor por causa de frivolidades. Para aqueles que amam a vida, o bom humor cede lugar apenas à ira, quando ela se faz necessária.
Para uma vida que dá constastes sinais da sua fragilidade e brevidade (você já reparou nisso hoje?), não soa insensatez desperdiçarmos nossas energias e nosso humor com tantas frivolidades? Para os cristãos, de um modo especial, que têm consciência da grandiosidade da sua vocação e da sua meta – a própria vida em Deus – tudo o mais se torna relativo quando confrontado com Deus mesmo e com tudo aquilo que, verdadeiramente, coloca resistência ao pleno desabrochamento do Reino em nosso meio.

Quebram-se os vidros do vitral. Mas, em nossa memória em nosso coração permanecerão as imagens coloridas e únicas que conseguiram traduzir de maneira harmoniosa tudo aquilo que se diz de bom a respeito de Deus: “...E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas a ilusão de que tudo podia ser meu para sempre.”*

* Miguel Sousa Tavares (Escritor português, a propósito da perda de sua Mãe, a escritora e poetisa Sophia de Mello-Breyner).

Primeiras impresões





Tudo começa do zero, do branco, do nada. Como agora... início...